Todas as minhas peças foram perdidas e agora só me resta desistir. Não é fácil estar em um tabuleiro sozinho numa hora dessas.
Atrás de mim só vejo o passado - uma parede invisível que me impede de recuar para a casa da saudade.
Aos lados apenas quadrículos livres - hora brancos, hora pretos... - fugas momentâneas que não me levam a lugar nenhum.
E na frente: um exército. É tanta peça adversária que eu perco as contas. São os pequeninos peões da discórdia: ávidos por conversas ao pé da orelha - prontos para falarem do jogos dos outros. São torres agressivas que quando se movem tremem minha estrutura. São bispos prontos para levarem o divórcio como causa principal. São cavalos, ou melhor, garanhões - com os olhos no coração da rainha e trotando como donos do mundo com a vitória na palma de suas ferraduras.
É a rainha que vê uma peça solitária do outro lado - só ela pode dar o mate.
Então, é só abrir mão do jogo perdido. Poupar tempo para o reinício de uma próxima partida.
Mas é ai que eu vejo que peça ainda me resta...
Que peça que eu sou...
Eu sou um rei...
Eu sou rei...
Eu sou o rei.
E reis no xadrez não morrem - eles lutam ou desistem. Pois tragam suas melhores armas.